Autor explica a vida pela economia
Economista Tim Harford usa a ciência para explicar o sexo, o amor e o salário do seu chefe
por Rita LoiolaTim Harford, 36, é um economista que só trabalha com coisas que realmente importam. Sexo, racismo, amor, vícios e o salário do chefe. Esse pacote de temas é o foco de seu livro A Lógica da Vida, recém-lançado no Brasil. Para ele, assuntos assim não só podem ser explicados, como seguem uma oculta lógica econômica, capaz de revelar o porquê de nossas escolhas. E nossos motivos nem sempre são os mais, digamos, altruístas. "Normalmente não percebemos que agimos em termos de custos e benefícios, mas inconscientemente, é assim que optamos por uma ou outra coisa", diz. É com base nessa fórmula simples que alguém decide, por exemplo, se casar (além de, vá lá, estar apaixonado) ou tornar-se viciado em drogas (mas, às vezes, o prazer também conta). O argumento de Harford é que a economia é uma excelente disciplina para a compreensão do mundo, a partir das escolhas humanas. Além de escrever livros sobre a economia do cotidiano (O Economista Clandestino, de 2007), ele também mantém a coluna "Querido Economista", onde responde todo tipo de dúvida existencial dos leitores do jornal inglês Financial Times. Porque ele, realmente, vê a economia em tudo. De sua casa, em Londres, o escritor explica como essa ciência é capaz de dar alguma lógica ao seu dia a dia.
* Então quer dizer que a economia faz a vida ter sentido?
Harford: Bem, não diria que ela faz tudo ter significado, mas sim, que ela está muito mais presente em nossas vidas do que imaginamos. Até nossas decisões mais íntimas, não raciocinadas em termos econômicos, envolvem custos e benefícios. Inconscientemente, sabemos os riscos e lucros de nossas ações, e isso é um ato econômico. É claro que há vida além da economia, mas ela exerce um papel fundamental, normalmente ignorado.
* Ou seja, é ela e não disciplinas como psicologia ou história que nos ajuda a entender o mundo?
Harford: Acho que está no mesmo patamar. Também estudei filosofia. Não diria que tudo se resume às teorias econômicas. Precisamos de todos os recursos para entender a vida. A economia é vista como algo restrito, sem ligação com a vida prática. Na verdade, ela está mais para coisas como história ou artes, disciplinas com largas aplicações. Os economistas percebem coisas que a maioria das pessoas não enxerga.
* Como a relação entre o casamento e as drogas?
Harford: Sim! Veja só, o casamento, assim como o vício, pode não dar certo, diminui sua liberdade e, quando você tenta sair é doloroso, complicado. Mas, ainda assim, um e outro podem proporcionar bons momentos. Tanto o novo viciado quanto o recém-casado sabem que podem estar fazendo uma baita besteira, mas acham que, no fim, vale a pena. Há um lado sentimental e irrefletido, mas também há uma grande parte que considera custos e benefícios. Economia pura.
* Quer dizer que o amor não é inexplicável?
Harford: Existe uma lógica oculta nesse sentimento. No livro, menciono um estudo estatístico com speed dates (um tipo de encontro em que grupos de desconhecidos conversam por três minutos e depois decidem com quem querem sair). Bom, não há explicações estatísticas de por que uma pessoa decide ou não sair com outra, mas, olhando os dados com cuidado, é possível prever reações. O amor tem muito de misterioso, mas também tem estratégias claras. Você pode dizer, por exemplo, que mulheres gostam de homens ricos. Mas a sentença muda segundo as comparações entre os candidatos. Se uma mulher vai a um speed date e há muitos ricos, ela sobe seu padrão. Então mesmo os muito abastados podem não ter dinheiro o suficiente. Mas se, em outro dia, ela encontra muitos pobretões, aquele rico que não servia antes se torna muito atraente. E esse cálculo determina muita coisa no campo amoroso.
* Como um jogo?
Harford: Seres humanos racionais respondem a incentivos. Se os incentivos mudam, as reações também são outras. Nos EUA, em regiões onde o aborto é proibido, os jovens têm menos doenças sexualmente transmissíveis e preferem a camisinha à pílula. Porque, para eles, o risco do sexo sem proteção é muito alto. Então, modificando-se os custos, mesmo algo tão incontrolável como o desejo sexual, ou o amor, muda.
* Mas ser racional é ser calculista?
Harford: Não acredito em um modelo de ser humano que age como uma máquina de calcular, nunca se arrepende, é frio e sem emoções. Ser racional é agir de acordo com os incentivos, percebendo custos e benefícios. Um exemplo de comportamento racional é o que acontece quando o preço do álcool sobe. Quem acaba prejudicado, consumindo menos, é o alcoólatra, porque são eles que consomem mais, certo? Então se o custo é mais elevado para eles, são eles que modificam o comportamento.Tim Harford, 36, é um economista que só trabalha com coisas que realmente importam. Sexo, racismo, amor, vícios e o salário do chefe. Esse pacote de temas é o foco de seu livro A Lógica da Vida, recém-lançado no Brasil. Para ele, assuntos assim não só podem ser explicados, como seguem uma oculta lógica econômica, capaz de revelar o porquê de nossas escolhas. E nossos motivos nem sempre são os mais, digamos, altruístas. "Normalmente não percebemos que agimos em termos de custos e benefícios, mas inconscientemente, é assim que optamos por uma ou outra coisa", diz. É com base nessa fórmula simples que alguém decide, por exemplo, se casar (além de, vá lá, estar apaixonado) ou tornar-se viciado em drogas (mas, às vezes, o prazer também conta). O argumento de Harford é que a economia é uma excelente disciplina para a compreensão do mundo, a partir das escolhas humanas. Além de escrever livros sobre a economia do cotidiano (O Economista Clandestino, de 2007), ele também mantém a coluna "Querido Economista", onde responde todo tipo de dúvida existencial dos leitores do jornal inglês Financial Times. Porque ele, realmente, vê a economia em tudo. De sua casa, em Londres, o escritor explica como essa ciência é capaz de dar alguma lógica ao seu dia a dia.
* Então quer dizer que a economia faz a vida ter sentido?
Harford: Bem, não diria que ela faz tudo ter significado, mas sim, que ela está muito mais presente em nossas vidas do que imaginamos. Até nossas decisões mais íntimas, não raciocinadas em termos econômicos, envolvem custos e benefícios. Inconscientemente, sabemos os riscos e lucros de nossas ações, e isso é um ato econômico. É claro que há vida além da economia, mas ela exerce um papel fundamental, normalmente ignorado.
* Ou seja, é ela e não disciplinas como psicologia ou história que nos ajuda a entender o mundo?
Harford: Acho que está no mesmo patamar. Também estudei filosofia. Não diria que tudo se resume às teorias econômicas. Precisamos de todos os recursos para entender a vida. A economia é vista como algo restrito, sem ligação com a vida prática. Na verdade, ela está mais para coisas como história ou artes, disciplinas com largas aplicações. Os economistas percebem coisas que a maioria das pessoas não enxerga.
* Como a relação entre o casamento e as drogas?
Harford: Sim! Veja só, o casamento, assim como o vício, pode não dar certo, diminui sua liberdade e, quando você tenta sair é doloroso, complicado. Mas, ainda assim, um e outro podem proporcionar bons momentos. Tanto o novo viciado quanto o recém-casado sabem que podem estar fazendo uma baita besteira, mas acham que, no fim, vale a pena. Há um lado sentimental e irrefletido, mas também há uma grande parte que considera custos e benefícios. Economia pura.
* Quer dizer que o amor não é inexplicável?
Harford: Existe uma lógica oculta nesse sentimento. No livro, menciono um estudo estatístico com speed dates (um tipo de encontro em que grupos de desconhecidos conversam por três minutos e depois decidem com quem querem sair). Bom, não há explicações estatísticas de por que uma pessoa decide ou não sair com outra, mas, olhando os dados com cuidado, é possível prever reações. O amor tem muito de misterioso, mas também tem estratégias claras. Você pode dizer, por exemplo, que mulheres gostam de homens ricos. Mas a sentença muda segundo as comparações entre os candidatos. Se uma mulher vai a um speed date e há muitos ricos, ela sobe seu padrão. Então mesmo os muito abastados podem não ter dinheiro o suficiente. Mas se, em outro dia, ela encontra muitos pobretões, aquele rico que não servia antes se torna muito atraente. E esse cálculo determina muita coisa no campo amoroso.
* Como um jogo?
Harford: Seres humanos racionais respondem a incentivos. Se os incentivos mudam, as reações também são outras. Nos EUA, em regiões onde o aborto é proibido, os jovens têm menos doenças sexualmente transmissíveis e preferem a camisinha à pílula. Porque, para eles, o risco do sexo sem proteção é muito alto. Então, modificando-se os custos, mesmo algo tão incontrolável como o desejo sexual, ou o amor, muda.
* Mas ser racional é ser calculista?
Harford: Não acredito em um modelo de ser humano que age como uma máquina de calcular, nunca se arrepende, é frio e sem emoções. Ser racional é agir de acordo com os incentivos, percebendo custos e benefícios. Um exemplo de comportamento racional é o que acontece quando o preço do álcool sobe. Quem acaba prejudicado, consumindo menos, é o alcoólatra, porque são eles que consomem mais, certo? Então se o custo é mais elevado para eles, são eles que modificam o comportamento.
"O casamento, assim como o vício em drogas, diminui a liberdade. Quando você tenta sair, é doloroso. Mas ainda assim, as duas coisas podem proporcionar bons momentos. Há um lado sentimental e irrefletido, mas também outro que considera custo e benefício. Economia pura" |
* Esse cálculo também é um dos responsáveis pelo racismo?
Harford: Descobri que existe o "racismo racional". Há um círculo vicioso que funciona assim: os empregadores não contratam, por exemplo, negros, porque não acreditam que eles sejam qualificados; os negros, percebendo a falta de chances, param de estudar; e, no fim das contas, tornam-se menos qualificados, confirmando a crença inicial. Faltou o incentivo, nasceu a discriminação. É diferente do racismo que rejeita negros sem motivos. Por isso, só acredito em políticas contra o racismo capazes de quebrar essa espiral.
* A política de cotas, talvez?
Harford: Minha grande questão com métodos de discriminação positiva é: eles incentivam ou desencorajam as minorias a trabalhar duro e se qualificar? Porque há dois caminhos, ou elas veem o espaço aberto e realmente estudam com a meta de não serem discriminados por falta de qualificação, ou imaginam que, com o lugar assegurado, não precisam se tornar profissionais melhores. Tendo a acreditar na primeira opção, mas não tenho a resposta. Faltam estudos.
* Esse raciocínio de privilégios é o mesmo que tornou trabalhar em um escritório algo tão insuportável?
Harford: Mais ou menos. O problema da repartição é que é muito difícil remunerar os funcionários de acordo com o que eles realmente merecem. Em algumas profissões é muito complicado justificar o salário de acordo com o trabalho que precisa ser feito e que realmente é feito. Isso incentiva as pessoas a trapacear, mentir, tornar-se super competitivas e usar todo tipo de artifícios. Isso faz, inclusive, com que alguns salários nem sejam merecidos. Os economistas não fingem que seu patrão merece o salário que recebe. Entre outras coisas, um alto pagamento pode ser um incentivo para os subalternos quererem chegar até lá. Não quer dizer que o chefe realmente mereça o cheque polpudo.
* É verdade que só rico atrai riqueza?
Harford: Bem, sim. Riqueza atrai riqueza, assim como cidades bem-sucedidas atraem pessoas bem-sucedidas. As cidades permitem que os indivíduos aprendam uns com os outros e aqueles que mais buscam isso são os que acabam indo para as cidades. Elas tornam-se, então, fonte de inovação e progresso, atraindo mais pessoas interessantes e melhorando.
* Entendi. Então, como eu não tenho dinheiro, é melhor desistir logo de tentar ser milionária...
Harford: Calma. É importante lembrar que as coisas mudam, sempre há espaço para novidades. Há tantas interações que não é possível usar apenas as ideias de meu livro para resolver os problemas. Temos que respeitar a complexidade do mundo. Uma coisa é dizer que as pessoas comportam-se racionalmente. Outra é dizer que o mundo é muito simples - o que, de fato, não é.